Thursday, November 08, 2007

A cidadela - Capítulo 39

Jacó Simão dobrou os joelhos, acocorando-se na beira do trecho de plataforma que lhe restava para equilibrar o corpo. Olhou bem para baixo e minuciosamente analisou uma arvorezinha de frutas cuja altura não ultrapassava cinco palmos. Tinha uma aparência de absoluta fragilidade, com ramos secos e folhagem danificada. O tronco, ao contrário, era grosso e retorcido, com raízes aparentes e rijas. A planta provavelmente estava penando para sobreviver fora de sua estação, tal sua aparência de decrepitude, com os poucos frutos que lhe restavam de pele murcha e aspecto pouco convidativo para uma degustação. A fome era implacável, o estômago de Jacó Simão se contorcia numa cólica atroz. Jacó Simão passara bem enquanto não tivera de encarar a visão, o odor de um alimento; embasbacado com suas reflexões e análises de pós-sonho, não estava nem um pouco preocupado com a fome ou qualquer outra manifestação de desagrado físico. Ao contrário de quando - liberto da tortura mental - percebera que não comia há horas, talvez há mais de um dia. E antes do desmoronamento, tinha plena consciência de sua fraqueza. O medo do evento posterior viria a interceptar o apetite por outro instante, mas agora, de fronte à fragilidade estrutural de seu ser, as náuseas lhe tomaram conta do corpo. Balançou para frente e tentou se apoiar no pouco chão que restara, mas as mãos frias e endurecidas, de típico sintoma do desfalecimento, nada podiam fazer frente ao desmoronamento eminente daquele homem. A boca de Jacó estava gravemente ressecada, lábios rachados e opacos, como se uma doença grave, um verme qualquer tivesse possuído o seu corpo. Os joelhos seguiram os passos do restante do corpo e tombaram ruidosamente sobre a superfície rochosa. O queixo veio ao encontro do peito num último e instintivo ato de tentar recuperar a estabilidade. E o último momento de sobriedade de Jacó foi quando a imagem do fruto murcho e recém apodrecido se tornou nauseabundo em demasia. Já tinha desmaiado quando o último fiapo de vômito constituído por um resto de secreção biliar e um resquício ínfimo de saliva lhe escorreu pelo queixo e tocou o solo, após ficar um curto instante dependurado em seu rosto, como uma baba cuja consistência impedia a dispersão imediata. Depois disso, caiu.

Depois de trocentos anos volto com a "A Cidadela"...Aos poucos, claro...